
Empresas podem demitir por justa causa quem participar de atos golpistas?
Perfis criados nas redes sociais — um deles já com mais de 1 milhão de seguidores — têm usado fotos e vídeos de bolsonaristas para identificar aqueles que participaram dos atos golpistas do último domingo (8), em Brasília. A ideia é também cobrar as empresas onde trabalham por responsabilização e demissão dos invasores.
Mas trabalhadores podem ser demitidos — inclusive por justa causa — por participarem de atos golpistas? Veja o que disseram advogados consultados pelo UOL.
O que diz a lei
A CLT define 13 situações específicas em que empregados com carteira assinada podem ser demitidos por justa causa — ou seja, sem direito a verbas rescisórias, como aviso prévio, saque do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e seguro-desemprego.
Esses motivos, no geral, se referem a alguma falta grave cometida pelo funcionário, seja intencional ou não. São alguns deles:
- má conduta;
- condenação por crime;
- embriaguez habitual ou durante o serviço;
- indisciplina ou insubordinação;
- abandono de emprego;
- ato contra a honra ou a boa fama do empregador.
A lei também prevê justa causa aos empregados pela prática de atos contra a segurança nacional, “devidamente comprovada em inquérito administrativo”.
Participação em atos golpistas
- Advogados ouvidos pelo UOL avaliam que funcionários que participarem de atos golpistas como os do último domingo (8) podem ser demitidos por justa causa.
- Esses casos podem ser enquadrados em três das situações listadas na CLT: má conduta, ato contra a segurança nacional ou contra a honra e boa fama do empregador.
“A ação dos terroristas, além de ser punível do ponto de vista criminal, pode levar à aplicação de justa causa por incontinência de conduta. Eles cometeram uma falta em sua vida pessoal que é moralmente condenável e que torna indesejável a continuidade da relação empregatícia, porque traz prejuízos à imagem do empregador.”
Nasser Ahmad Allan, sócio do Gasam Advocacia
“O direito de se manifestar não pode se confundir com excessos e até cometimento de crimes. Foi uma coisa muito significativa, invadiram as sedes dos Três Poderes. Entende-se que houve excessos.”
Ricardo Christophe da Rocha Freire, sócio do Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados
Pessoal x profissional
- Uma advogada consultada pelo UOL, porém, acredita que a participação em atos golpistas, por si só, não seria suficiente para embasar uma demissão por justa causa.
- Marcia Sanz Burmann, sócia do Autuori Burmann Sociedade de Advogados, concorda que as pessoas identificadas devem ser punidas, mas apenas na esfera particular.
- A única exceção seriam os casos em que a participação em atos golpistas, de alguma forma, prejudicasse a imagem do empregador.
- “Se uma pessoa for flagrada nesses atos com o uniforme da empresa, por exemplo”, diz.
- “A publicidade pode acabar associando a imagem do empregado à do empregador. Não é um dano financeiro, mas é um dano na reputação”, acrescenta Ricardo Freire.
“Lógico que são atos graves, passíveis de criminalização e punição, mas na esfera privada. O que essas pessoas fazem na sua esfera privada, em princípio, não traz consequências para o trabalho. É a mesma coisa que mandar um empregado embora por questões políticas. Essas pessoas podem e devem ser punidas criminal e civilmente, mas na esfera particular.”
Marcia Sanz Burmann, sócia do Autuori Burmann Sociedade de Advogados
Justa causa pode ser revertida?
- Todos os advogados com quem o UOL conversou reforçam que demissões por justa causa podem ser questionadas na Justiça.
- Por isso, o empregador deve reunir todas as provas, como fotos, vídeos e documentos oficiais, que confirmem a participação do funcionário em atos golpistas.
“Se a empresa tem provas robustas dos atos de quebra de confiança e motivadores da demissão, dificilmente o empregado conseguirá reverter a justa causa na Justiça.”
Marcel Zangiácomo, sócio do Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella Advogados
“Não dá para simplesmente, de maneira indiscriminada, sair dispensando pessoas por justa causa. Minha sugestão é que os empregadores documentem os fatos que geraram essa gravidade. O juiz vai analisar a quantidade de provas reunidas.”
Ricardo Christophe da Rocha Freire, sócio do Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados
Publicado por UOL